Da mesma maneira que um menino da roça não entende como funciona o elevador do prédio em que moram os seus primos da cidade, o menino da cidade não consegue compreender a logística banal de subidas em árvores de diversas espécies e para diversos fins.
Hoje, sentado no play do prédio de um amigo (eu era o menino do Mega Drive, não das árvores; da invasão do salão de festas, não do roubo das pêras do vizinho bigodudo e conservador) recebi uma visita surpresa de um percevejo, que, fofo e gracioso, posou no meu cabelo como se caísse num colchão macio de pura alegria contagiante.
Fora da Discovery, meus reflexos de primata lançaram minha mão esquerda para retirada daquele que seria o predador desgraçado derrubando-o no chão. E eu pisaria naquele inseto maldito para estraçalhar sua pequena carapuça verde bizarra se ele fosse ao menos um pouco perigoso... Talvez...
Interrompendo meu momento filosófico, o amigo ao meu lado negou a opção da violência, alegando que o percevejo morto ia feder demais. Claro, ia mesmo. Incrível como a lógica da selva funcionou na cidade dessa vez.
No mato, o gracioso percevejo verde sobrevoa as plantas tranquilamente enquanto planeja o próximo passo de sua vida longa e proveitosa. Caso um animal um pouco maior tente comê-lo, sentirá aquele cheiro de desgraça, aquele cheiro que você não colocaria na boca nem bêbado numa aposta de bar. O animal dificilmente comeria o percevejo ou então o comeria e iria se lembrar daquele prato como o pior de sua vida, poupando todos os familiares e companheiros de vida do percevejo que serviu de bode expiatório, herói de uma causa.
Na cidade, o humano deixou de pisar naquele percevejo predador por conta de uma mera vaidade, de uma mera falta de vontade de sentir o odor alheio, por mera frescura. Porém, em todos os outros 100 casos, os humanos mataram os percevejos impiedosamente, concordando com a lógica evolucionária da localização geográfica dos primos.
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